PALÁCIO ANCHIETA — o tesouro capixaba (Vitória/ES).
O Palácio Anchieta é o principal local histórico de Vitória e abriga nos dias de hoje a sede do Governo do Espírito Santo, mas sua origem remonta a meados do século XVI, quando jesuítas iniciaram a construção da igreja que chamaram de São Tiago, bem como do colégio anexo. Fui fazer uma visita guiada no local e foi tão rica que não poderia deixar de registrar e compartilhar aqui!
Antes dos jesuítas
Enterradas sob o palácio foram encontradas evidências de que o local escolhido pelos jesuítas para a construção de sua residência já havia sido habitado anteriormente. Ali estavam pequenos fragmentos de cerâmica produzidos por grupos de língua tupi-guarani!
As aldeias, costumes, crenças e utensílios destes grupos são registrados no período colonial por viajantes europeus e missões religiosas, que produziram uma vasta documentação e literatura específica para compreensão da língua e catequese destes povos.
Estes índios ocuparam intensamente o litoral brasileiro e foram os primeiros a estabelecerem contato com os colonizadores europeus. Os jesuítas, em especial, constituíram inúmeros núcleos de povoamento nas proximidades de locais já habitados, criando aldeamentos que deram início a muitas vilas e cidades dos dias atuais.
História do palácio
O palácio foi construído em 1551 por mão de obra indígena e ordenada pelos jesuítas que ali chegaram, com a finalidade de servir de igreja e de colégio na época da colonização, cujos alunos eram indígenas. A partir daí, o prédio foi sendo expandido, de modo que sua última ala foi finalizada em 1747 (totalizando 196 anos de construção).
Apenas doze anos após a conclusão das obras, porém, em 1759 os jesuítas foram expulsos de todas as colônias e possessões de Portugal, por conta de um decreto do Rei D. José, influenciado pelo Marquês de Pombal. A partir de então, o Palácio passou a ser utilizado como sede dos órgãos administrativos e residência oficial dos governantes.
Daí em diante não houve grandes alterações no prédio, até o governo de Jerônimo Monteiro (1908–1912), que promoveu a reforma do palácio como parte de um projeto que visava dar à cidade de Vitória um ar de modernização. Tomando-se como inspiração o Palácio de Versalhes, várias mudanças internas e externas foram efetuadas, sendo a mais marcante a transferência da fachada da praça João Climaco para a baía de Vitória. Além disso, com a reforma, o palácio passava a ser enquadrado como um exemplo de edifício de arquitetura eclética, uma vez que misturava diversos estilos anteriores (clássico, gótico e romântico).
Já em 1945, durante o governo de Jones dos Santos Neves (1943–1945 e 1951–1954), o edfício finalmente foi nomeado Palácio Anchieta, em homenagem ao Padre José de Anchieta, um dos responsáveis pela construção do edifício e um dos líderes da catequização indígena no Brasil.
Os governantes do Estado residiram no Palácio até 2004, quando foi decidido que a residência governamental seria transferida para Vila Velha, a cidade vizinha a Vitória. Desde então, o prédio se tornou apenas local de trabalho dos governadores e ponto de visitação turística. Para atingir essa finalidade, passou por uma última época de restauro e modernização durante o governo de Paulo Hartung (2004–2009), que o deixou com a configuração atual.
Padre Anchieta
Um dos pontos interessantes tratados na visita guiada é sobre o corpo do Padra Anchieta, personalidade que dá nome ao palácio e que tinha sido, originalmente, enterrado na Igreja que deu origem ao prédio atual. Vale a observação de que o clérigo foi enterrado em posição fetal, de acordo com a tradição indígena local.
Quando os jesuítas foram expulsos do Brasil, estes solicitaram que o corpo fosse transportado para Portugal, mas o barco naufragou durante o trajeto. Há alguns anos, porém, uma expedição arqueológica encontrou o barco naufragado e também os restos mortais (ainda preservados) de José Anchieta.
Em seguida, pedaços do seu corpo foram distribuídos entre várias localidades. Atualmente, o Palácio Anchieta abriga um pedaço da tíbia do Padre, e um túmulo simbólico foi enviado por Portugal como forma de homenagem. Após muita polêmica, o Padre José de Anchieta foi canonizado em 2018 pela Igreja Católica.
Destaques do Palácio
Entre os vários espaços do enorme Palácio, alguns merecem destaque especial. Um deles é o pátio, que segue o modelo do famoso Panóptico de Bentham”, a partir da ideia de servir como estrutura de vigilância constante de quem estivesse ali.
Além disso, a única abertura do pátio é para o céu, simbolizando que a única forma dos indígenas saírem dali seria pelo céu, ou seja, pela morte sem pecados.
Merece destaque também o poço artesiano localizado no meio do pátio, onde era permitido que todas as pessoas da comunidade em volta do palácio buscassem água na época que os jesuítas ali habitavam. Assim, fortalecia-se uma imagem de poder para os jesuítas, enquanto fornecedores do bem mais básico para a população.
Outro ponto do palácio que merece destaque é, naturalmente, a sua fachada, que apesar de imponente é repleta de irregularidades que não passam despercebidas por qualquer observador atento (a exemplo da falta de simetria entre as duas metades da fachada). Além disso, pra quem enxerga o palácio diretamente de frente, isto é, da baía de Vitória, ocorre um efeito de ilusão de ótica de modo a parecer que a rua entre as escadarias inferior e superior não existe, o que por consequência faz o palácio aparentar ser ainda maior.
Por fim, cabe a observação acerca das cores das paredes e dos portões do palácio, que são respectivamente amarelas e verdes, em homenagem à bandeira do Brasil.
Galeria de ex-governadores
Em homenagem à sua função de sede do Poder Executivo estadual, o palácio reserva uma sala em homenagem aos ex-governadores.
Uma observação curiosa a ser feita diante da galeria de fotos dessa sala é que quase todos os ex-governadores entre o final do século XIX e início do século XX usavam bigode, que estava muito em alta e se relacionava a uma estética que visava transmitir a ideia de masculinidade. A partir da década de XX, porém, praticamente mais nenhum governador utilizava bigode. Isso porque foi nessa época que a Gilette abriu uma fábrica no Brasil e investiu em campanhas de marketing que incentivaram os homens a adotarem esta nova estética como padrão de masculinidade.
Entre os ex-governadores, merece destaque Albuíno Cunha de Azevedo, o primeiro governador negro do Espírito Santo e responsável por uma verdadeira revolução no transporte público capixaba. Pode-se citar, ainda, José Inácio Ferreira, o último governador a morar no palácio.
Outro aspecto interessante a ser observado é que, nos últimos 20 anos, o governo do Espírito Santo foi alternado entre apenas dois governadores: Paulo Cesar Hartung Gomes e Renato Casagrande (atual).
Sem dúvidas o Palácio Anchieta é um dos locais imperdíveis para quem visita Vitória e se interessa por história e política. A visita guiada (gratuita) acontece todos os dias de hora em hora e é riquíssima em informações, recomendo muito! Além disso, o palácio também abriga exposições temporárias sempre muito interessantes a serem visitadas.
Espero que você tenha gostado do post e, para qualquer dúvida, estou a disposição por aqui ou pelas outras redes sociais. Se quiser saber mais, me acompanhe no instagram (@wheresluiza), onde eu posto várias informações e dicas sobre a minha viagem a Vitória e muitas outras!