Visita ao Anitkabir: mausoléu do maior líder da Turquia!
Ancara, apesar de ser a capital da Turquia, acaba ficando de fora do roteiro da maioria das pessoas que visitam o país. No entanto, eu incluí Ancara na minha viagem para encontrar duas amigas que moram lá e também por querer conhecer a capital do país, e só posso dizer que foi uma decisão totalmente acertada e que recomendo demais!
A minha experiência em Ancara foi maravilhosa, e isso se deveu principalmente ao Anitkabir! Juro que só por esse lugar já vale totalmente a pena dar uma passadinha na cidade.
O Anitkabir é o mausoléu do grande líder e primeiro presidente da Turquia: Mustafa Kemali Ataturk, responsável por diversas reformas com o objetivo de tornar seu país moderno e independente. O local se dedica a homenagear sua figura pela grande importância para a história e política do país, além de registrar e divulgar sua história pessoal. Além da entrada no monumento ser gratuita, é também recheado de simbolismos e muitas informações interessantes, algumas das quais decidi reunir neste post!
História do local
Conta a lenda que a história do local começa quando, em um dia qualquer, Ataturk passeava por ali com sua “equipe” de governo e disse desejar ser enterrado ali quando morresse, por ser no topo de um morro e dali ser possível enxergar toda a cidade.
Seu desejo foi atendido e, depois de falecer no Dolmabahçe Palace no ano de 1938, em Istambul, seu corpo foi levado para Ankara e matido em consevação no Museu das Civilizações da Anatólia até o seu atual mausoléu ficar pronto, apenas em 1953! A construção levou esse tempo todo porque, além de ser enooooorme, muitos vestígios arqueológicos dos frígios (povo ao qual pertencia o famoso Rei Midas) foram encontrados no local, gerando a necessidade de serem retirados com todo cuidado e enviados para o Museu das Civilizações, para só então o corpo de Ataturk poder ser alocado ali.
Neste processo, vários foram os arquitetos que se inscreveram no concurso para projetar o monumento, inclusive estrangeiros. Ao final, no entanto, foram escolhidos dois arquitetos turcos — Emin Onat e Orhan Arda — , que fizeram o monumento recheado de simbolismos, tornando-o muito interessante.
A visita e os simbolismos
A visita começa já na subida por uma rampa, e não a toa: o objetivo é que o visitante trace um caminho longo até o monumento, a fim de que chegue no topo cabisbaixo pelo cansaço, e não eufórico, em respeito ao corpo que ali se encontra abrigado.
Chegando no topo da rampa, há uma escultura de cada lado, retratando os homens e as mulheres da Turquia. Entre os homens, há a representação do grupo dos militares, da burguesia (uma estátua com um livro na mão, em referência ao grupo com mais erudição) e dos camponeses. Entre as esculturas das mulheres, a da esquerda, segurando uma peça de artesanato, faz referência à polidez e ao bom comportamento das mulheres turcas. A mulher do meio, cobrindo os olhos, chora pela morte de Ataturk. A da direita, por sua vez, representa a força das mulheres do país.
Seguindo em frente, o visitante passa a percorrer a Rua dos Leões, que tem um simbolismo interessantíssimo. O primeiro aspecto a ser notado é a sua superfície irregular, que obriga quem estiver passando a olhar para baixo a fim de não tropeçar e, com isso, chegar no mausoléu em posição de respeito e lamento pela morte de Ataturk, da mesma forma que ao subir a rampa.
Outro ponto que merece destaque são as 24 estátuas de leões. A razão disso é que, antigamente, o povo turco era nômade e dividido em várias tribos, que por sua vez eram divididas em clãs. Dessas tribos, se originaram outros países atuais de origem turca, a exemplo do Azerbaijão. A Turquia, por sua vez, surgiu a partir da tribo dos Ulus, que era dividida em 24 clãs, aqui simbolizado pelos 24 leões. Isso porque esse animal remete à ideia de poder e força, ao mesmo tempo em que foram representados abaixados significando que estão em paz.
Ao chegar no fim da Rua dos Leões, não se precipite indo direto para o mausoléu! O complexo foi pensado de forma a ser percorrido um trajeto cheio de história e referências antes de se chegar ao local onde de fato se encontra o corpo de Ataturk!
A primeira parada do percurso é a Torre do Mehmetçik. “Mehmet” é a tradução árabe de Maomé e, graças à forte presença do islamismo no país, este é um nome extremamente comum entre os homens na Turquia. O “çik”, por sua vez, é um sufixo que demonstra carinho. Assim, “Mehmetçik” é a forma como os soldados são chamados na Turquia, com a ideia de considerá-los algo como os “filhos da Turquia”, devido ao serviço que prestam ao país. Na Torre de Mehmetçik, há na parede um desenho retratando a figura de uma mãe se despedindo de seu filho soldado (Mehmetçik) que está indo para a guerra.
A torre do lado oposto tem retratados em sua parede uma árvore da vida — símbolo da Turquia — e um homem com uma espada abaixada e a mão estendida. Este desenho é tem o objetivo de simbolizar que a Turquia é um país que está em paz e que, apesar de ter força para lutar, se manifesta em direção aos seus inimigos apenas para evitar a guerra, buscando atacar apenas em caso de defesa.
Seguindo em frente, o trajeto nos convida a entrar em uma sala onde se encontra o tanque utilizado para transportar o corpo de Ataturk após a sua morte em Istambul. Os turcos até hoje contam, de geração para geração, o quão triste foi o dia de sua morte para o país, que ficou em luto generalizado e extremamente comovido pela perda de seu grande líder.
Na direção exatamente oposta à fachada do mausoléu, se encontra uma tumba onde se encontra Ismet Inonu, vice-presidente da Turquia durante o período que Ataturk era presidente e também seu melhor amigo. Quando aquele faleceu, Inonu assumiu seu cargo e se tornou muito polêmico para a história por defender o turco como língua das cerimônias islâmicas do país para que os fieis pudessem compreendê-las melhor, já que até então era em árabe e poucas pessoas dominavam este idioma.
A próxima parada é a Torre da Paz, que retrata um soldado, acompanhado de uma árvore da vida (simbolo da Turquia), com a espada levantada sobre um homem e uma mulher turcos. O desenho significa que a Turquia está em paz, e só atacaria com a finalidade de defender seu povo.
Na sequência, passamos pela Torre de 23 de abril — dia da grande assembleia nacional turca! Depois da guerra da independência, a República da Turquia foi proclamada e, com isso, Ataturk liderou o povo para a tomada do poder a ele pertencente, em especial o de fazer as leis, em detrimento do poder até então exercido de forma autoritária pelo sultão. Para concretizar essa ideia democrática no país, fez-se a primeira — e histórica — assembleia nacional, no local onde hoje funciona o Museu da República, em Ancara.
“Our opinion is that the power, authority, sovereignty and governance must be directly granted to the nation and should be in the hands of the nation.”
Sobre Ataturk
Em seguida, o trajeto percorre uma parte fechada, como um pequeno museu, no qual não é permitido tirar fotos. Ali estão reunidas fotos dos familiares de Ataturk, algumas de suas roupas, alguns objetos pessoais, documentos e paineis que contam um pouco sobre sua história.
Aqui, algumas informações merecem registro! Mustafa nasceu em Tessalônica, atual cidade na Grécia, mas que antigamente pertencia à Turquia. Seu nome original era apenas Mustafa, até encontrar um professor que também se chamava Mustafa e, por isso, adicionou “Kemali” para se diferenciar. Interessante notar, aqui, que até então não eram utilizados sobrenomes na Turquia. Essa ideia foi implantada apenas no governo de Ataturk, como parte do projeto de modernização do país. Com isso, o povo lhe atribui o sobrenome de “Ataturk”, que significa algo como “pai dos turcos”, em referência à sua importância para a história nacional.
Outra curiosidade é que, apesar de ser militar, quando Ataturk não estava nos campos de batalha, sempre se vestia com roupas modernas e não militares, a fim de expressar a ideia de que a Turquia era um país civilizado, pacífico e moderno.
Mustafa Kemali Ataturk ficou órfão de pai muito jovem, foi um leitor voraz — leu mais 3.000 livros — e morreu de cirrose por causa do excesso de álcool para combater o frio nos campos de batalha. Seu falecimento se deu em 1938, ano que é comumente representado com o 8 na horizontal, de forma a simbolizar o infinito e, com isso, a ideia de que seu legado se perpetua eternamente para o país.
Ataturk e a Turquia
Mais a diante, o trajeto perpassa um corredor com diversos quadros informativos. Nesse contexto, merece destaque o que registra a Batalha de Galipoli, onde cerca de 1000 pessoas foram mortas (contados turcos e não turcos). Entre eles, muitos eram os australianos enviados a força pelos ingleses para lutar contra os turcos, que, como demonstração de respeito a esta condição, enterraram os “inimigos” da mesma forma que os turcos vítimas da guerra. Em seguida, Ataturk ainda ordenou o envio de uma carta para a família de cada soldado australiano morto naquela batalha, informando que os filhos daquelas famílias estavam devidamente enterrados e que, agora, passavam a ser filhos da Turquia também!
Em seguida, passamos por uma galeria com pinturas históricas muito interessantes. Entre tantas, merece destaque a da foto abaixo. Isso porque ela remete ao fato de ter sido “quase um milagre” a Turquia ter vencido a guerra pela sua independência, uma vez que a Inglaterra e a França tinham muito mais força e tecnologia bélica. Enquanto isso, tudo que era utilizado pelos soldados turcos nas batalhas era feito de forma artesanal, geralmente pelas mulheres. Apesar disso, os turcos tinham ao seu favor uma grande vantagem: o conhecimento sobre a geografia e relevo dos locais em que ocorriam as batalhas, o que foi decisivo para vencer a guerra.
Seguindo em frente, o trajeto passa por um corredor dedicado a registrar as reformas e o impacto político do governo de Ataturk. Entre as muuuitas mudanças, merecem registro sua defesa dos direitos femininos (instituindo o direito ao voto, ao trabalho e a não-obrigatoriedade do uso de burca, por exemplo) e a reforma linguística — até então, todos os documentos oficiais eram escritos em árabe, idioma que apenas uma pequena parcela da população compreendia, ao contrário do turco. Por isso, Ataturk oficializou o turco como língua oficial do país e instituiu o alfabeto latino, em substituição ao árabe.
Finalmente, o tour termina na sala onde se encontra seu túmulo. Seu rosto, registrado na porta, fica exatamente de frente para o Castelo de Ankara e sua bandeira, no topo da cidade, para que assim Ataturk possa sempre contemplar o esplendor, o poder a grandiosidade da Turquia, país cuja história lhe deve muito.
Por fim, vale notar o letreito posicionado na fachada do monumento, no qual está escrito algo que pode ser traduzido como “O poder pertence incondicionalmente ao povo”, remetendo aos ideias democráticos e populares instituídos por Ataturk na Turquia.
Espero que você tenha gostado do post e que, se tiver a oportunidade de visitar o Anitkabir, se apaixone pelo lugar e pela sua riqueza cultural tanto quanto eu! Para qualquer dúvida, estou a disposição por aqui ou pelas outras redes sociais. Se quiser saber mais, me acompanhe no instagram (@wheresluiza), onde eu posto várias informações e dicas sobre a minha viagem à Turquia e muitas outras!